Brasil

Retorno do voto impresso é um retrocesso, diz presidente do TJ-AM

Domingos Chalub avalia que o projeto do voto impresso nas eleições no Brasil, como defende o presidente Bolsonaro, é um retrocesso. “Quem diz que urnas não tem segurança não demonstra onde é a insegurança”

Adentrar a era da tecnologia é um caminho sem volta e no Poder Judiciário não é diferente. Para adequar os processos do âmbito jurídico, o Tribunal de Justiça do Amazonas (TJ-AM) enviou para a Assembleia Legislativa do Amazonas (ALE-AM) o projeto de Lei 313/2021, para modificar o quadro de pessoal da Corte, dando o ‘start’ oficialmente na transformação tecnológica.

Para esclarecer os pontos dessa pauta, o A CRÍTICA conversou com o presidente do TJ-AM, desembargador Domingos Chalub. Ele falou ainda sobre o trabalho do Judiciário na pandemia, os ataques ao sistema Judiciário brasileiro e o voto impresso, no bate-papo transcrito a seguir.

O que o projeto de Lei 303/2021 propõe para aprovação do Legislativo. Isso não aumentaria as despesas do tribunal com pessoal?

É um manual de procedimentos de uma secretaria-geral no Poder, ajustando ao que o CNJ determinou. Há uma nomeação mais não cria cargos, nem cria despesa, só uma requalificação para ficar dentro dos padrões administrativos e cria por meio desses padrões novos procedimentos eletrônicos.

Então não seria aumento de salários, somente adequação para esse processo tecnológico?

Exatamente. Agora tem o SEI (Sistema Eletrônico de Informações) e a tramitação de qualquer tribunal de Justiça será adequada na prestação jurisdicional em termos de tecnologia, mas algumas tramitações em alguns setores se deram no papel, então agora vai passar a ser todo no sistema eletrônico. Vai dar um avanço na celeridade inclusive para colocar no portal da transparência e vai mudar algumas nomenclaturas sem aumentar despesa. Como foi feito há muitos anos, antes de ter internet, o próprio Estado do Amazonas fez estruturação administrativa. É uma migração horizontal, não vertical.

Na ALE-AM, o orçamento estadual para o próximo ano está em discussão nas comissões, o TJ-AM pretende pleitear uma parcela maior de repasses?

Estamos fazendo esse levantamento na Diretoria de Orçamento e Finanças para nós projetarmos as despesas, principalmente para saber se houve o aumento de pessoal para equilibrar o orçamento.

E o que ficará do trabalho remoto implantado na pandemia?

Vai ter uma centralização no próprio CNJ (Conselho Nacional de Justiça) pelo novo sistema que é o PJE (Processos Judiciais Eletrônicos), que o TJ-AM vai mandar centralizar as movimentações de um modo geral. Migrando para esse sistema que é o PJE o CNJ fica com a possibilidade de dar transparência fiscalizatória do comando de lá. O trabalho remoto ficará dependendo da necessidade da pandemia ou não. No geral, os servidores terão uma hora de sair do remoto para ir para o presencial, porque no presencial tem que haver um atendimento ao público de qualquer maneira. Com relação aos advogados e procuradores nem tanto porque o sistema é todo eletrônico no qual eles operam mas o atendimento de forma ativa a população tem que ser presencial.

E como estão as comarcas no interior do Estado?

No interior está indo bem, porque existia um sistema chamado Projuri que agora eles vão migrar também para o PJE. No interior sempre vai haver um problema por causa da distância das comarcas. As comarcas lá de Itamatari, Eirunepé, Japurá ficam mais distantes, mas as outras comarcas, naquela região ali no Médio Solimões, estão indo bem: Tefé, Codajás, Coari. O problema maior é no rio Japurá, com Japurá, Jutaí. Para você ter uma ideia, ainda leva mais de cinco dias ou seis de embarcação para se chegar lá.

Atualmente como está a situação dos concursados do TJ-AM?

Esses concursados nós chamamos até os da reserva. Foram todos chamados. Alguns da reserva ainda estão reclamando, mas é em número de 20 ou 25. Esses daí talvez sejam chamados para o ano, por causa do problema do impacto financeiro. Na nossa administração nós não temos mais nenhum temporário. Alguns são temporários, mas são terceirizados e não são das atividades fins do tribunal.

A aposentadoria compulsória da desembargadora Encarnação Salgado, sob suspeita de venda de sentenças, traz prejuízo à imagem do Tribunal?

Esse assunto foi julgado pelo CNJ e STJ não temos nenhuma interferência. Eu ainda não me manifestei sobre isso porque ainda não fui comunicado formalmente pelo CNJ. Eu tomei conhecimento por intermédio da imprensa. Prejudicar sempre prejudica, porque é um membro do tribunal, mas se você for ver um termo de comparação, porque todo o ser humano, em todas as instituições por qualquer uma razão transgridem às normas, mas isso não se restringe ao Poder Judiciário. Isso vai acontecer eternamente. Detectando o problema: apura. E nós vamos investigar com todas as forças para punir essa infração. O setor privado também tem o mesmo problema.

Como o senhor avalia os ataques à membros do judiciário nas redes sociais, inclusive com ofensas a membros da Suprema Corte?

Eu sou um defensor da democracia. Sou defensor radicalmente da democracia. Eu acho importante que todo mundo tenha o direito de fazer comentários. Comentários, favorável ou desfavoráveis, aí cabe no devido processo legal apurar. Isso aí é normal da Democracia. Só nas magistraturas que a gente nem toma conhecimento porque não é publicado. Se você for observar isso é no mundo todo. Tem ataque nos Estados Unidos, ataque na Europa. Não é um processo novo da sociedade democrática, só não espalham essas coisas por aí onde tem ditadura

Como o senhor analisa o debate sobre o voto impresso no Congresso Nacional?

É um retrocesso. Não tem porque mudar as coisas. Está sendo proposto agora voltar para o voto impresso. A urna eletrônica tem segurança. As pessoas que dizem que não tem segurança não demonstram onde é a insegurança. Tanto é que nós fazemos eleições na própria associação de magistrados pela urna eletrônica. Ela tem segurança. O voto impresso, além de inviável em uma população como a nossa, o sistema nivela os lados. Como você vai explicar para a geração da internet que eles votarão em uma célula? Isso é loucura. Eles nem sabem pegar em uma caneta para votar. Isso iria causar mais problema. Todo mundo vai impugnar. [perguntando] ‘cadê meu voto? Meu voto está errado’. Seria a mesma coisa que nós abandonarmos os computadores e voltar para máquina de escrever.

Qual a análise do senhor sobre a atuação do Poder judiciário amazonense durante a pandemia?

Eu acho que o comportamento do Tribunal de Justiça e dos magistrados foi excelente, primeiro que não houve intromissão do Poder Judiciário sobre as demandas do Poder Executivo que estabeleceu dentro dos seus próprios padrões o fornecimento quer de oxigênio, teve de medicamentos, de vacinas ou atendimento hospitalar. Quando foi chamado, agiu com equilíbrio. Sempre no intuito de melhorar.

O Poder Judiciário não enfrentou o problema que o Executivo enfrenta, por exemplo, nós aqui tivemos condições de fazer todo o trabalho remoto e aumentou até a produtividade através do sistema eletrônico, mas o Executivo não tem condições de fazer isso, nem o Legislativo porque como pode controlar as pessoas no meio da rua, na Zona Leste, porque o TJ-AM tem até um controle entre os seus membros e servidores, mas o Executivo tem que controlar a massa da rua e é daí que nasce o problemas. O Poder Judiciário é um poder estático e ele não vai pra rua para resolver problemas da sociedade ele fica no tribunal aguardando as demandas por isso ainda não fez a abertura total do atendimento presencial, está sendo gradativo para que evitasse o foco de contaminação dentro das próprias varas do Poder Judiciário.

PERFIL

Nome: Domingos Jorge Chalub Pereira

Idade:70 anos

Estudos: Graduado em Direito pela Universidade Federal do Amazonas (Ufam)experiência: Foi inspetor regional da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (ECT). Atuou na advocacia. Ingressou na magistratura em 2004 pelo critério do Quinto Constitucional na vaga destinada à OAB-AM. No TJ-AM exerceu os cargos de vice-presidente e de presidente (2009 a 2010).

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